Aproveitando esse tempinho de chuva e
de frio, bem a cara do outono, um céu cinzento em que vez ou outra o sol tenta
se abrir mas não consegue, devido a presença de inúmeras nuvens que vão se
multiplicando, multiplicando até despejarem a chuva esperada, dedico este post
a um dos movimentos artísticos que mais me encanta e que acho que tem mais
haver comigo: o Simbolismo. Muitos de vocês já devem ter ouvido falar deste
movimento artístico, pelo menos no Ensino Médio, onde nas aulas de Literatura,
estudamos diversas correntes literárias, como o romantismo, o
realismo-naturalismo, e o simbolismo,entre outras. Mas o que representou o
Simbolismo na Literatura e na Arte? Qual sua relação com a música? Por que se
deu este movimento? Quando ele surgiu? Este movimento chegou ao Brasil? Muitas
perguntas que vou tentar responder aos que já se esqueçam ou os que nunca
estudaram este universo das sensações.
Primeiro, precisamos saber que o
Simbolismo foi um movimento artístico que abrangeu a música, a pintura e
a literatura, nascido na França, por volta de 1880. Movimento este,
antipositivista, antinaturalista e anticientificista, ao contrário das demais
correntes materialistas e racionalistas como o Realismos Naturalismo e o
Parnasianismo.
Contextualizando o momento em que se
originou e desenvolveu o Simbolismo, descobre-se que ele conviveu com o período
que antecedeu a Primeira Guerra Mundial (1911-1918) e também o pré-modernismo,
que se anunciava em 1902. Um período em que todos aqueles ideais culminaram por
gerar o primeiro e grande conflito mundial, e como aconteceu com o Romantismo
que reagiu diante da crise do Iluminismo, os Simbolistas reagiram contra as
correntes analíticas dos meados do século, em que a coisa e o fato triunfavam
sobre o sujeito, buscando reconquistar o sentimento de totalidade. E ao mesmo
tempo em que valorizavam o mundo interior e o espiritual.
Os simbolistas, no entanto, conseguiram
ir mais além dos Românticos, atingindo a camadas do inconsciente e do
subconsciente. O símbolo considerado um elemento importante na fala humana,
pois a linguagem verbal se iniciou pela linguagem dos símbolos,e também
originalmente preso a contextos religiosos, passa a exprimir a evocação,
principalmente as mais abstratas, as aspirações e os impulsos dos instintos
humanos.
A poesia deve apresentar-se por meio
de sugestões, fazendo uso de uma linguagem indireta (vaga, imprecisa) e
figurada, sugerindo conteúdos emotivos e sentimentais sem, entretanto,
narrá-los ou descrevê-los. Por isso o uso intenso de reticências e de pausas,
nos poemas simbolistas, que indicam esse “não dizer” ou o próprio “nada”.
É desse pressuposto que surge a teoria das
correspondências. Teoria esta, introduzida pelo poeta francês Charles
Baudelaire na obra Flores do mal (1855), na qual, tudo no
mundo tem correspondências entre si e pode ser explícito através de símbolos.
Paul Verlaine, outro poeta francês,
pregara a aproximação da poesia com a música, “antes de qualquer coisa,
música”, logo, ao que diz respeito à versificação ela é despojada daquele
formalismo tradicional, que foi adotado até o extremo pelos Parnasianos em
busca da “arte pela arte”, e transformada em “uma arte absolutamente livre”. No
lugar das regras e das alternâncias de rimas, encontram-se as assonâncias, e
assim a musicalidade e obtida, gerando uma sonoridade capaz de provocar emoção.
Ou seja, para os simbolistas, a música estava em primeiro lugar, por isso o uso
frequente do estribilho, do deslocamento voluntário de elementos da frase, com
proposições e palavras intercaladas, silepses, inversões, aliterações. A
liberdade era tanta, que os poetas recorriam a arcaísmos, a nomes próprios, e
até introduziam em seus versos, neologismos.
Um pouco mais sobre o poeta Paul Verlaine
(1844-1896) pelo seu poema Arte Poétique, de 1885, no qual o verso “De la
musique avant tout chose”- a música antes de qualquer coisa” que abre tal
poema, é considerado um verdadeiro manifesto da poesia simbolista. O poeta de
fato colocou a música acima de tudo, pois ele queria um versos fuido,
rítimico,solúvel no ar, a exemplo da belíssima “Chanson d’ Automme” – Canção de
Outono, publicada em Poemes Saturniens (Poemas Saturninos), de 1866, em que a
música está tão entranhada neste poema que é quase impossível uma tradução ao
pé-da-letra. Entretanto, há há algumas versões de Chanson d’ Automme, entre
elas, destaco a do poeta Alphonsus de Guimaraens (1870-1921), representante do
simbolismo no Brasil.
CHANSON D'AUTOMNE
Paul Verlaine
Les sanglots longs
Des violons
De l'automne
Blessent mon
coeur
D'une langueur
Monotone.
Tout suffocant
Et blême, quand
Sonne l'heure,
Je me souviens
Des jours anciens
Et je pleure.
Et je m'en vais
Au vent mauvais
Qui m'emporte
Deçà, delà,
Pareil à la
Feuille morte.
CANÇÃO DO OUTONO
Tradução: Alphonsus de Guimaraens
Os soluços graves
Dos violinos suaves
Do outono
Ferem a minh'alma
Num langor de calma
E sono.
Sufocado, em ânsia,
Ai! quando à distância
Soa a hora,
Meu peito magoado
Relembra o passado
E chora.
Daqui, dali, pelo
Vento em atropelo
Seguido,
Vou de porta em porta,
Como a folha morta
Batido...
Bem, se eu disse que Alphonsus de
Guimaraes é um dos representantes do simbolismo no Brasil, logo, vemos que este
movimento também chegou ao país. Entretanto, voltando ainda aos europeus, os
artistas dessa corrente literária foram chamados por seus contemporâneos, de
“decadentistas”, por seu desencanto pelo mundo, pela matéria, e também de um
grupo que representantes da volta do “mal do século”, do romantismo. Isto se
explica pelo retorna da valorização do amor, morte, sonho, pessimismo diante do
mundo real, porém, aprofundando mais esses sentimentos, já que o viam como um
estado de sublimação, e da própria libertação da matéria.
Por último, comento sobre o Simbolismo
no Brasil, que se deu em um ambiente de lutas sangrentas iniciadas em 1893, no
Rio Grande do Sul, chegando a outros estados brasileiros, pela insatisfação com
a recém-inaugurada República.Um período, como podemos ver, também marcado
de frustrações angústias e falta de perspectivas. Seus
representantes foram Cruz e Sousa e Alphonsus de Guimaraes. O primeiro é
considerado, pelos teóricos, como a figura mais importante do Simbolismo
brasileiro, já que se impôs desde logo como “chefe” desse novo movimento, tendo
sua obra Missal (1893) –poema em prosa -, e Broquéis (1893)
–poesia, como os inauguradores deste movimento aqui no país. E o segundo,
preferiu manter-se fiel a um “triângulo” que caracterizou toda a sua obra:
misticismo, amor e morte. A crítica o considera o mais místico poeta da
literatura brasileira, pois se Cruz e Sousa é visto como o “poeta solar”,
Alphonsus de Guimaraens é visto como o “poeta lunar”.
E confesso que um dos meus poetas favoritos, também pelo fato de sua profunda religiosidade e devoção a Santa Terezinha e Nossa Senhora, a exemplo da obra O setenário das Dores de Nossa Senhora (1899). Nesta obra o poeta atesta sua devoção pela Virgem, em que as dores da Nossa Senhora é cantada em sonetos. E saindo um pouquinho do mundo literário, em que reinava na Europa, Stépnhae Mallarmé, que estimulou enormemente os poetas simbolistas, como Charles Baudelaire, Arthur Rimbaud, Paul Verlaine; e chegando ao mundo das artes pásticas, destaco o pintor francês Gustave Moreau. Este, que se tornou célebre por ser um dos principais impulsionadores da arte simbolista do século XIX.
E confesso que um dos meus poetas favoritos, também pelo fato de sua profunda religiosidade e devoção a Santa Terezinha e Nossa Senhora, a exemplo da obra O setenário das Dores de Nossa Senhora (1899). Nesta obra o poeta atesta sua devoção pela Virgem, em que as dores da Nossa Senhora é cantada em sonetos. E saindo um pouquinho do mundo literário, em que reinava na Europa, Stépnhae Mallarmé, que estimulou enormemente os poetas simbolistas, como Charles Baudelaire, Arthur Rimbaud, Paul Verlaine; e chegando ao mundo das artes pásticas, destaco o pintor francês Gustave Moreau. Este, que se tornou célebre por ser um dos principais impulsionadores da arte simbolista do século XIX.
VI
De luar vestido, o fúlgido semblante
entre bastos cabelos irisados,
e sobre o flanco a túnica irradiante
que eram nesgas de céus nunca sonhados.
Os seus olhos de poente e de levante
em silêncios de luz ilimitados;
era o celeste Cavaleiro andante,
Anunciador de místicos Noivados...
E que Noivado o seu! Nuvens radiosas
cercando o Mensageiro ativo e doce,
debaixo de amplo céu de seda e rosas...
E dentro das olheiras cor-de-goivo,
o olhar da Virgem santa eternizou-se:
O Espírito de Deus era o seu Noivo...
Agora, deixo um poema
muito emblemático de Alphonsus de Guimaraes:
A
Catedral
Entre brumas, ao longe, surge a aurora,
O hialino orvalho aos poucos se evapora,
Agoniza o arrebol.
A catedral ebúrnea do meu sonho
Aparece na paz do céu risonho
Toda branca de sol.
E o sino canta em lúgubres responsos:
"Pobre Alphonsus! Pobre Alphonsus!"
O astro glorioso segue a eterna estrada.
Uma áurea seta lhe cintila em cada
Refulgente raio de luz.
A catedral ebúrnea do meu sonho,
Onde os meus olhos tão cansados ponho,
Recebe a benção de Jesus.
E o sino clama em lúgubres responsos:
"Pobre Alphonsus! Pobre Alphonsus!"
Por entre lírios e lilases desce
A tarde esquiva: amargurada prece
Poe-se a luz a rezar.
A catedral ebúrnea do meu sonho
Aparece na paz do céu tristonho
Toda branca de luar.
E o sino chora em lúgubres responsos:
"Pobre Alphonsus! Pobre Alphonsus!"
O céu e todo trevas: o vento uiva.
Do relâmpago a cabeleira ruiva
Vem acoitar o rosto meu.
A catedral ebúrnea do meu sonho
Afunda-se no caos do céu medonho
Como um astro que já morreu.
E o sino chora em lúgubres responsos:
"Pobre Alphonsus! Pobre Alphonsus!"
Entre brumas, ao longe, surge a aurora,
O hialino orvalho aos poucos se evapora,
Agoniza o arrebol.
A catedral ebúrnea do meu sonho
Aparece na paz do céu risonho
Toda branca de sol.
E o sino canta em lúgubres responsos:
"Pobre Alphonsus! Pobre Alphonsus!"
O astro glorioso segue a eterna estrada.
Uma áurea seta lhe cintila em cada
Refulgente raio de luz.
A catedral ebúrnea do meu sonho,
Onde os meus olhos tão cansados ponho,
Recebe a benção de Jesus.
E o sino clama em lúgubres responsos:
"Pobre Alphonsus! Pobre Alphonsus!"
Por entre lírios e lilases desce
A tarde esquiva: amargurada prece
Poe-se a luz a rezar.
A catedral ebúrnea do meu sonho
Aparece na paz do céu tristonho
Toda branca de luar.
E o sino chora em lúgubres responsos:
"Pobre Alphonsus! Pobre Alphonsus!"
O céu e todo trevas: o vento uiva.
Do relâmpago a cabeleira ruiva
Vem acoitar o rosto meu.
A catedral ebúrnea do meu sonho
Afunda-se no caos do céu medonho
Como um astro que já morreu.
E o sino chora em lúgubres responsos:
"Pobre Alphonsus! Pobre Alphonsus!"
Enfim, espero que esse breve resumo sobre
este movimento literário tão místico, tão musical, talvez o único que tenha
conseguido resgatar a união intrínseca entre a música e poesia que se perdeu ao
longo dos séculos, por a poesia ficar restrita a elite e a música as massas,
esquecendo-se de que as duas se originaram juntas, com a poesia sendo
escrita para ser recitada e ser acompanhada da lira, daí o nome “gênero
lírico”, fica a #SuperDica para que vocês leiam pelo menos um desses poetas
simbolistas e se deixam levar por este “universo das sensações” e da extrema
musicalidade de seus versos.
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